MELANIE KLEIN E "ONDE VIVEM OS MONSTROS"


“Na noite em que Max vestiu sua fantasia de lobo e saiu fazendo bagunça

uma atrás da outra

a mãe dele o chamou de ‘MONSTRO!’

e Max disse: ‘OLHA QUE EU TE COMO!’

e acabou sendo mandado para a cama sem comer nada.

Naquela mesma noite nasceu uma floresta no quarto de Max”.

(SENDAK, 1963)


“Onde vivem os monstros” é um livro escrito e ilustrado por Maurice Sendak (Estados Unidos, 1928-2012) que fala sobre um assunto muito presente na psicanálise e tratado com um carinho especial pela psicanalista austríaca Melanie Klein (1882-1960): o mundo interno e as fantasias infantis.


O menino Max, personagem central do livro de Sendak, após muito bagunçar é punido pela sua mãe e fica sem o jantar. Então, em um movimento de muita introspecção, se recolhe em uma jornada muito íntima e particular para a terra onde vivem os monstros. Esta terra cheia de criaturas fantásticas nada mais é do que o psiquismo de Max, o psiquismo de uma criança com raiva.


Lá Max torna-se o comandante de todos os monstros da ilha, monstros que são os conteúdos dos fragmentos daquilo que ele aprendeu a partir de suas experiências, principalmente as mais precoces, do período pré, peri e pós-natal. É um mundo cheio de ferocidade, crueldade, fantasias e possibilidades, inclusive aquelas de reparação, tão importantes ao desenvolvimento saudável do indivíduo.


A partir de suas teorizações, Melanie Klein pode nos ajudar a compreender esta experiência de Max. A psicanalista nos situa nas formas mais primitivas de vivências como a agressividade e a inveja e como ela entende as primeiras vivências infantis com seu primeiro objeto de experiência não-eu: o seio materno.


Para Klein, desde o primeiro contato com o seio provedor e repleto de coisas boas, como o leite, o afago, o conforto, o carinho.  A criança se sente impelida a querer para si tudo aquilo que é tão maravilhoso daquela experiência. As privações, mesmo aquelas que podem ser admitidas, se tornam, para aquele psiquismo tão primitivo, experiências permeadas por emoções muito hostis provenientes daquilo que Klein chamou de seio mau.


Com o passar do tempo, as ricas e qualitativas experiências desse bebê com sua mãe vão permitir que haja uma integração desse objeto: a mãe que frustra é a mesma que alimenta, que dá carinho; seio mau e seio bom são duas facetas da mesma pessoa. Mas até que isso ocorra , justamente como resquício desse fenômeno, é que a vida psíquica vai tomando forma e, junto com ela, as fantasias tão ricas e fundamentais para a nossa vivência simbólica.


Max nos apresenta as suas fantasias em plenas produções. Mas logo tudo se acalma e aquele psiquismo excitado dá lugar à calmaria, com a esperança de que a criatividade pode nos fazer muito bem, principalmente nos momentos de resolução de conflitos internos.


Max voltou para o seu próprio quarto e nos ensinou que nós também podemos fantasiar, elaborar e retornar. Em segurança.

Leandro Caravina Pereira. Psicólogo (CRP 06/129743), Psicanalista e Acompanhante Terapêutico. Formado em 2015 pela Universidade Paulista, pós-graduando em “Psicanálise e Contemporaneidade” e “Psicologia Social e a Antropologia”. Realiza atendimentos à crianças, adolescentes e adultos.




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